quarta-feira, 30 de junho de 2010

Estatuto da Igualdade Racial é uma ameaça à Saúde da População Negra?

*Jurema Werneck

O dia 17 de junho de 2010 amanheceu agitado, com vários pedidos de entrevista e de trocas de informações. Telefone tocando, caixa postal cheia de comentários e indagações. Descontentamento de todos os lados. Afinal, o Estatuto aprovado pelo Senado Federal, capitaneado por uma estranha aliança entre o Partido dos Trabalhadores e o Democratas às vésperas de processo eleitoral nacional é bom para quê? Para quem? Decididamente não é bom para gente que, como eu, como tantas e tantos, lutamos cotidianamente para garantir que o desejo da sociedade brasileira por justiça se mantenha vivo e sem entraves (por que eles não nos ouviram?). Também não é bom para aquelas e aqueles que precisam agora viver e fazer acontecer a certeza que o racismo está mais fraco, que o Brasil pode ser o que um dia desejou ser: uma democracia sem racismo ( por diálogo - com a sociedade (onde foi que estes princípios se perderam?). Quanto à luta contra ao racismo patriarcal, esta teve reafirmadas suas razões para existir e seguir em frente na direção de um país melhor, aquele que ainda não existe. Mas que, pela força de nosso compromisso, um dia vai existir - nem que seja para as netas de nossas netas. Para as descendentes das descendentes de Acotirene e Na Agotime, de Xica da Silva e Mariana Crioula, de Laudelina Campos Melo, Lélia Gonzalez, Beatriz Nascimento e Obassy. Por isso elas lutaram. Para isso herdamos suas lutas. Foi um dia de indagações: o que significam as mudanças no capítulo sobre saúde? Supressão da obrigatoriedade de registro da cor das pessoas nos formulários de atendimento e notificação do Sistema Único de Saúde? Abandono da necessidade de pactuação entre União, Estados e Municípios para a descentralização de políticas e ações em saúde da população negra? Abdicação da definição de indicadores e metas na política pública? Afinal, o que eles queriam negar? O que pensaram aprovar? É preciso reconhecer que, num primeiro plano, as decisões tomadas de supressão destes itens, parecem ter se baseado em grande ignorância sobre os processos de gestão de saúde. O que precisariam saber? Que em 2006 o Conselho Nacional de Saúde, organismo que por lei tem a tarefa de aprovar a criação de políticas na área de saúde, já havia aprovado por unanimidade esta que um ministro de políticas de promoção da igualdade racial, um ex-ministro de políticas de promoção da igualdade racial, senadores do Democratas em aliança com senadores do Partido dos Trabalhadores e muitos assessores deles aparentemente desconhecem: a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra. Eles também ignoravam o fato de que esta mesma política já foi pactuada pelos entes federados na Comissão Intergestores Tripartite/ CIT, também segundo preceitos legais para a gestão de políticas no campo da saúde. Esta pactuação definiu um Plano Operativo com atribuições diferenciadas e complementares para a União, os 27 estados brasileiros e os mais de 5600 municípios do país, contendo 25 ações a serem desenvolvidas em 04 anos, com 29 metas a serem alcançadas no período, em duas fases: a primeira, entre os anos de 2008 e 2009 e a segunda, entre 2010 e 2011, com duas prioridades a enfrentar: a) problema 1: Raça Negra e Racismo como Determinante Social das Condições de Saúde: acesso, discriminação e exclusão social; e b) problema 2: Morbidade e Mortalidade na População Negra.

Possivelmente ignoravam que a assinatura deste compromisso pelo Ministério da Saúde, o Conselho Nacional de Secretários de Saúde/CONASS e o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde/CONASEMS aconteceu em abril de 2007. Tampouco deviam saber de sua

publicação no Diário Oficial na União em 14 de maio de 2009 (Portaria 992). Além do atual desenvolvimento de iniciativas, ainda que iniciais, nas diferentes regiões, estados e cidades do Brasil. Isto apesar da insistência criminosa do Congresso Nacional em negar financiamento para a saúde e sendo conivente, ou mais, co-patrocinador da ampliação da vulnerabilidade de brasileiros e brasileiras, da manutenção de altas taxas de sofrimento, adoecimento e mortes.

Mas toda a magnitude de sua ignorância se coloca ao considerarem que nós, que sabemos disto porque somos parte da luta que gerou tais conquistas, iríamos permitir que tal irresponsabilidade vá longe demais!

Preciso dizer que reconheço, além das marcas da grande ignorância orgulhosa, fortes sinais de um racismo também orgulhoso de dizer seu nome em público. Pois o que, senão ele, fez com que parlamentares e partidos à beira da obsolescência acreditem que se pode impunemente

ignorar os indicadores de saúde da população negra, que contradizem perspectivas de justiça e de direito. Somente o racismo lhes dá desprezo pelo Outro o suficiente e faz com que aceitem a morte de mulheres negras em taxas seis vezes maiores do que as brancas, por causas evitáveis por um pré-natal destituído de racismo e preconceito, elevando as taxas de morte materna no Brasil a patamares escandalosos. Ou que considerem irrelevante a freqüência de homicídios contra a população negra ter aumentado de 24.763 vítimas de assassinatos para 29.583 entre os anos de 2000 e 2006, segundo dados do Ministério da Saúde, enquanto que a freqüência de mortes de pessoas brancas pela mesma causa caiu de 18.712 para 15.578 no mesmo período. O que traduz riscos insuportáveis de homens negros, especialmente os jovens, morrerem por homicídio e patamares 2,2 vezes mais altas do que para homens brancos. E riscos para mulheres negras 1,7 vezes maiores do que para as mulheres brancas. E estamos falando em resultados da política de desarmamento e das iniciativas de segurança dita pública! Isto acompanhado de maiores taxas de mortalidade infantil para crianças negras, cuja diferença em relação às brancas também aumenta; ou a enorme tragédia do adoecimento mais cedo, de maior vivência de agravamento e complicações por doenças evitáveis ou facilmente tratáveis. E os efeitos devastadores da hipertensão entre nós, com maiores taxas de morte e acidente vascular cerebral e suas seqüelas; ou da falta de diagnóstico e tratamento do diabetes tipo 2, que resultam em maior mortalidade, mutilações, cegueira e suas tragédias pessoais, familiares, comunitárias. Como parlamentares, partidos e assessores puderam acreditar que acharíamos sua displicência, seu descaso, seu desprezo, sua falta de solidariedade e compromisso outra coisa senão racismo? Por isso respondo a quem me pergunta que sim, o Estatuto aprovado faz mal para a saúde da população negra, ao Sistema Único de Saúde e à sociedade brasileira. Não por seus efeitos diretos, pois esta mesma população negra, o SUS (que é feito por pessoas, trabalhadoras e trabalhadores, gestoras e gestores, que buscam fazer bem o seu trabalho) e a sociedade dispõem de mecanismos que não hesitarão em mantidos. Mas principalmente por que um Congresso Nacional e seus partidos políticos desvinculados tão acintosamente dos sonhos e projetos de justiça social e equidade torna nosso mundo pequeno, solidariedade. Magoa nosso desejo de futuro melhor para todas e todos. Mas, como costumamos dizer e já faz muito tempo: a luta continua!



*Conselheira Nacional de Saúde, Coordenadora da Comissão
Intersetorial de Saúde da População Negra do CNS. Representante da Articulação de Organizações de Mulheres negras Brasileiras/ AMNB, coordenadora de Criola.

O parecer do senador Demóstenes Torres (DEM-Goiás) transformou o projeto do Estatuto da Igualdade Racial, apresentado em 2003 pelo Senador Paulo Paim como o texto legal capaz de sintetizar as principais reivindicações da população negra brasileira, em um monstrengo irreconhecível, um "frankstein".

O que nasceu para ser uma segunda Lei da Abolição – destinado a dar o conteúdo que faltou à primeira – tornou-se um "frankstein": feio por fora e pior ainda por dentro, dadas as intenções e propósitos inconfessáveis dos que manobram nos bastidores pela sua aprovação.
A desconstrução do projeto começa no artigo 1º com a supressão do objetivo do Estatuto: “combater a discriminação racial e as desigualdades estruturais e de gênero que atingem os afro-brasileiros, incluindo a dimensão racial nas políticas públicas e outras ações desenvolvidas pelo Estado”.
Também de saída, já no artigo 1º, o senador goiano rejeita o termo “população negra” recusando a classificação do IBGE que define os brasileiros como pretos, pardos, amarelos, brancos e indígenas. Demóstenes invoca para si o direito de dizer quem é afro-brasileiro: “as pessoas que se classificam como tais ou como negros, pretos, pardos ou por definição análoga”.
O senador goiano, como é sabido, pertence ao Democratas - o Partido que representa os interesses dos grandes ruralistas e fazendeiros. Natural, portanto, que fuja como o diabo da cruz da questão quilombola – uma pedra no sapato dos herdeiros dos donos da Casa Grande.


A tesoura


A tesoura de Demóstenes risca do projeto de Estatuto o termo “terras de quilombos”. Mas não fica por aí. Coerente com o discurso feito na audiência pública promovida pelo Supremo Tribunal Federal, em março, que discutiu a questão das ações afirmativas e cotas, quando pretendeu fazer a revisão da história do Brasil para dizer que os casos de estupro durante o escravismo haviam sido consentidos pelas mulheres negras, o senador passa a tesoura em todo o dispositivo que garantia que as medidas de ação afirmativa deveriam se nortear “pelo respeito à proporcionalidade entre homens e mulheres afro-brasileiros, com vistas a garantir a plena participação da mulher afro-brasileira como beneficiária deste Estatuto”
Para alguém que se dá ao direito de classificar quem é negro e quem não é – na contramão do próprio IBGE que assegura aos cidadãos brasileiros o direito à auto-declaração - Demóstenes considera uma bobagem a necessidade da obrigatoriedade do quesito cor “em todos os documentos de uso do SUS, como cartões de identificação, prontuários médicos, fichas de notificação de doenças, formulários de resultados de exames laboratoriais, inquéritos epidemiológicos, estudos multicêntricos, pesquisas básicas, aplicadas e operacionais, qualquer outro instrumento que produza informação estatística”
E, claro, para provar que é radical na sua negativa dos efeitos dos 350 anos de escravidão, a tesoura de Demóstenes é célere na supressão de todos os artigos que tratam da saúde da população negra. O artigo 14 tinha a seguinte redação: “O poder Executivo incentivará a pesquisa sobre doenças prevalentes na população afro-brasileira, bem como desenvolverá programas de educação e de saúde e campanhas públicas de esclarecimento que promovam a sua prevenção e adequado tratamento”. Para que? Pergunta Demóstenes do alto da varanda da Casa Grande. Tesoura neles.


Retrocesso


Mais célere do que a dona Solange dos tempos da censura na ditadura, Demóstenes também considerou uma bobagem o artigo 15 que dizia: “Os estabelecimentos de saúde, públicos ou privados, que realizam partos, farão exames laboratoriais nos recém-nascidos para diagnóstico de hemoglobinopatias, em especial o traço falciforme e a anemia falciforme”.
A supressão desse artigo representa um retrocesso enorme porque o “teste do pezinho”, implantado de alguns para cá, ao invés de ser universalizado, passa a ser restringido.
Cotas? Nem pensar. O senador goiano, cá prá nós, considera essa história de cotas, conversa fiada de negro folgado querendo vaga sem esforço nas Universidades ou nas empresas.
Todo o artigo 70 do projeto aprovado pela Câmara dos Deputados foi simplesmente riscado, sem dó. “O Poder Público adotará, na forma de legislação específica e seus regulamentos, medidas destinadas à implementação de ações afirmativas, voltadas a assegurar o preenchimento por afro-brasileiros de cotas mínimas das vagas relativas (...) “aos cursos de graduação em todas as instituições públicas federais de educação superior do território nacional”.
Mestres de capoeira virando instrutores “reconhecidos pública e formalmente pelo seu trabalho”, religiões de matrizes-afrobrasileiras? O que é que é isso, minha gente? Pergunta Demóstenes, tesoura em punho. Tesoura em todos os dispositivos que tratavam do “reconhecimento da liberdade de consciência e de crença dos afro-brasileiros e da dignidade dos cultos e religiões de matrizes africanas praticados no Brasil deve orientar a ação do Estado em defesa da liberdade de escolha e de manifestação de filiação religiosa, individual e coletiva, em público ou em ambiente privado”.


Mais retrocesso


Nem pensar em reconhecer “aos praticantes das religiões de matrizes africanas e afro-indígenas" o direito de "ausentarem-se do trabalho para a realização de obrigações litúrgicas próprias de suas religiões, podendo tais ausências serem compensadas posteriormente”. Que heresia! Diria Demóstenes com seus botões, pernas esticadas na rede da varanda.
O capítulo que tratava do mercado de trabalho igualmente foi suprimido pelo zeloso senador, bem como igualmente o que tratava dos direitos da mulher. “O Poder Público garantirá a plena participação da mulher afro-brasileira como beneficiária deste Estatuto da Igualdade Racial e em particular lhe assegurará “a instituição de política de prevenção e combate ao tráfico de mulheres afro-brasileiras e aos crimes sexuais associados à atividade do turismo”.
Que tremenda, bobagem! Essas negrinhas que consentiram ser estupradas nos bons tempos, agora querem ter essas regalias, teria resmungado, a tesoura pronta a desfechar o golpe fatal.
Não teve menos sorte todo o capítulo que tratava da Comunicação: a tesoura goiana foi implacável. A possibilidade de filmes e programas veiculados pelas emissoras de televisão apresentarem imagens de pessoas afro-brasileiras em proporção não inferior a 20% (vinte por cento) do número total de atores e figurantes, foi considerado, particularmente, um abuso desses negros que insistem em não "saber" o seu lugar. Participação de afro-brasileiros na publicidade? Nem pensar. Tesoura neles.
No quesito acesso à Justiça, Demóstenes – que já foi promotor público -, sabia exatamente o que estava fazendo quando suprimiu sem dó nem piedade “a inclusão da temática da discriminação racial e desigualdades raciais no processo de formação profissional das carreiras policiais federais, civil e militar, jurídicas da Magistratura, do Ministério Público e da Defensoria Pública”.


Ópera bufa


Resumo dessa triste ópera: os senhores da Casa Grande – os mesmos que no Parlamento do Império impuseram as Leis do Ventre Livre, do Sexagenário, a Lei Áurea, apenas para dar alguma satisfação aos seus donos – (na época a poderosa Inglaterra, que pressionava pela Abolição, interessada em expandir o mercado assalariado, incompatível com o escravismo), continuam legislando para nós negros. E o que é pior: o fazem em nosso nome.
No processo de tramitação do Estatuto, os cortes já não foram poucos. Paim cedeu, compôs-se. O projeto foi sendo enxugado: primeiro retirou-se, por exigência da Fazenda, o Fundo de Promoção da Igualdade Racial, depois o seu caráter impositivo, tornaram-no autorizativo.
Na Câmara, depois da pressão que levou 100 mil assinaturas à Brasília, a partir de mobilização desencadeada em São Paulo, mais cortes; até o anúncio de um inusitado acordo com a bancada demo-tucana para aprová-lo.
O acordo foi descumprido pela bancada demo e agora eis que se anuncia o substitutivo fruto da tesoura de Demóstenes, e que ameaça ser aprovado – em tempo célere, rapidinho, como convém em acordos e negociações de bastidores, cujos propósitos não podem ser revelados à luz do dia.
Nos tais acordos e negociações, teriam se envolvido o ministro chefe da SEPPIR, Elói de Araújo, e o próprio senador Paim, a essa altura, provavelmente em crise existencial, em face do monstrengo, sem forma, nem conteúdo, que lhe é apresentado como o Estatuto que um dia pretendeu que fosse seu.
A pergunta que não quer calar é: a quem interessa que uma Lei que vem com 122 anos de atraso, seja transformada numa declaração vazia de conteúdo. Por que um Governo – como Governo Lula no alto dos seus quase 80% de popularidade, com maioria esmagadora no Senado e no Congresso, permite que os interesses de 50,3% de afro-brasileiros sejam repassados ao que há de pior na política brasileira – o DEM e os seus parceiros?
É preciso lembrar aos que estão tentados à comodidade do silêncio cúmplice: o que está sendo exibido ao distinto público não é o Estatuto da Igualdade; é um “frankstein” apenas para atender aos interesses de quem pretende transformá-lo em talismã eleitoral –, peça de marketing para satisfazer a tosquice dos ingênuos e o apetite dos espertos.



* Com a palavra as entidades e lideranças do Movimento Negro Brasileiro – em especial os que fazem parte da base do Governo.
São Paulo, 12/6/2010

Dojival Vieira

Jornalista Responsável

Registro MtB: 12.884 - Proc. DRT 37.685/81

Email: dojivalvieira@hotmail.com; abcsemracismo@hotmail.com

Equipe de Redação:

Dojival Vieira, Dolores Medeiros, Julia Medeiros e Gabriel Silveira

Estatuto da Igualdade Racial divide Movimento Negro!

Aprovado nesta semana na Câmara dos Deputados, o Estatuto da Igualdade Racial divide opiniões de integrantes do Movimento Negro.




Há consenso, no entanto, em um ponto: o texto da lei não contempla bandeiras importantes e históricas para os negros, como a definição de otas em universidades e na mídia e sobre quem são os remanescentes dos quilombos.

O projeto de lei que cria o estatuto foi aprovado pelos deputados em caráter conclusivo (não passou pelo plenário), na quarta-feira (9), dez anos após o início das discussões do projeto no Congresso.
Agora, ainda precisa passar pelo Senado. Ou será analisado em comissão em caráter conclusivo ou irá à votação em plenário, conforme o que ficar decidido entre os senadores. Só depois é que irá à sanção presidencial. O governo quer que tudo esteja pronto para que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancione a lei no dia 20 de novembro, Dia da Consciência Negra.



Confira abaixo os detalhes sobre o Estatuto da Igualdade Racial.

* Prós

O ministro da Igualdade Racial, Edson Santos, diz que o estatuto ressalta a tese de que não há igualdade racial no Brasil. Segundo ele, no caso das cotas nas universidades, o tema ficou de fora porque está sendo analisado em projeto separado que tramita no Senado.

"O estatuto é o reconhecimento do Estado brasileiro em relação às desigualdades raciais e é a criação de um instrumento que garante inclusão. É uma vitória daqueles que defendem a tese de que nem todos são iguais e que há obrigação do Estado brasileiro com aqueles que estão excluídos de oportunidades do nosso país", afirma o ministro.

Edson Santos participou das negociações para aprovação do estatuto na Câmara e afirmou que o consenso "não foi fácil". "Foi gratificante. Nos levou a empenho grande, no convencimento das pessoas. Não foi fácil buscar o consenso até na questão do projeto ser votado na Câmara de forma terminativa."

O ministro disse que assim que o projeto de lei sair da Câmara ele deve ir pessoalmente ao Senado conversar com o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), para discutir a criação de uma comissão especial para que o tema seja analisado em caráter terminativo.
Um dos dirigentes da Coordenação Nacional de Entidades Negras (Conen), Flávio Jorge afirma que, embora o estatuto não seja "exatamente" o que a entidade deseja, "significa o coroamento de uma luta que o movimento negro tem desenvolvido na construção de políticas públicas e superação do racismo". "Passa a ser um marco desses 30 anos de luta."


* 'Incompleta'

Para o dirigente da Conen, o estatuto ficou incompleto porque não trata sobre a questão dos quilombos e nem das cotas nas universidades.
"Vamos continuar lutando pelas cotas porque a elite branca continua criando resistência e a terra e o conhecimento geram privilégios e resistência."
Ele diz que, embora incompleta, a lei é um avanço democrático. "Não foi uma concessão. É fruto de nossa luta, é uma conquista. O estatuto permite que se continue avançando. O combate ao racismo é um processo. Não é conquista de um dia para outro."



* Consenso possível

Autor da proposta que cria o estatuto, o senador Paulo Paim (PT-RS) diz que o ideal teria sido aprovar o projeto "do jeito que saiu do Senado", com cotas para negro na mídia e definições sobre a população quilombola.
"Temos que entender que na correlação de forças da Câmara, foi o possível. (...) Tem muitas questões importantes. Vamos dando passos, foi uma vitória parcial."
Ele afirmou que a expectativa é que o texto seja aprovado com facilidade no Senado. "O estatuto saiu do Senado muito mais contundente e volta em linha de mais consenso. Por isso, não vejo muita dificuldade."
O deputado federal Damião Feliciano (PDT-PB) afirmou que a origem do estatuto tinha "muito mais avanço". "Eles foram negociando durante todo o processo sempre para diminuir a questão dos direitos da negritude. Aprovou com toda negociação diminuída. Vejo como um estatuto desidratado."
"Aprovamos porque é melhor 20% de alguma coisa do que 100% de nada", completa o deputado.
Feliciano avalia que a questão das cotas nas universidades deveria estar no estatuto. Ele disse que nem mesmo a questão dos incentivos para quem contratar negro deve ser comemorada se não houver implantação das cotas nas universidade.
"É preciso chamar atenção que a questão é mais profunda. Contratar 20% para ser serviçal não é avançar na sociedade. Para o negro ser porteiro, ser motorista, trabalhar na cozinha. É preciso que se avance na posição social e para isso precisa de estudo."



* Contra

Para o coordenador nacional de organização do Movimento Negro Unificado (MNU), Ricardo Bispo, o estatuto é um "retrocesso". "Foi o retrocesso mais criminoso que o movimento negro já assistiu. (...) Somos maioria em um país que faz questão de não nos dar visibilidade. O estatuto veio para destruir nossa auto-estima. Rigorosamente, só sobrou coisa para quem não tem postura crítica, para quem acha que coisa qualquer serve."
Ele cita que a redução para candidatos em partidos, a falta de cotas nas universidades e de definições sobre quilombolas e sobre o que é racismo prejudicou o texto.
"Nesse momento o que temos mostrado é que era um erro aprovar o estatuto porque seria aprovado um estatuto esvaziado. Cansamos de denunciar e eles diziam que estávamos errados. Que era preferível qualquer coisa desde que houvesse um marco legal. (...) Mas isso é inócuo. Da forma que está dificulta a nossa luta. Eles vão jogar na nossa cara que já temos um estatuto."